domingo, 4 de abril de 2010

Cristo, minha esperança, ressuscitou!

As palavras que seguem poderiam ser de qualquer discípulo de Jesus. Sim, de um qualquer, e até de qualquer tempo. Se todos os discípulos temos pelo menos uma ferida — e eu creio que temos — uma nos é comum: em algum momento fomos tontos e desleixados em relação às palavras e às promessas de Jesus.
As palavras que seguem vou pô-las na boca de Tiago, o Boanerges, um dos mais amigos de Jesus, um dos primeiros a segui-lo. Boanerges foi apelido que Jesus lhe chamou, porque era homem de pêlo na venta, de antes quebrar que torcer. Homem rijo que adormeceu nos momentos chave, na Transfiguração e na Agonia de Jesus; e no fim O abandonou como os outros; ouçamo-lo:
Aquele encontro do Mestre com os discípulos foi o último sem suspeitarmos que o era. Jesus convocou-nos para a casa de Neftalí. Foi ali que comemos a Ceia pascal sem sabermos que era uma comida de despedida. E era-o
efectivamente. Naturalmente os acontecimentos precipitaram-se: Jesus foi denunciado por um dos nossos e assinalado com um beijo.
Surpreendidos não tínhamos sequer uma espada à mão. Aliás não éramos um exército ou
guerrilha e só um de nós tinha uma lâmina pouco maior que uma faca. Tudo foi estupor e surpresa. A mansidão de Jesus e a convicção da milícia que O prendeu foram tão impressionantes que O deixámos ir, sem mais. O julgamento foi célere, nocturno, longe das vistas, e com recurso a testemunhas falsas. Eficaz, portanto. Pedro aproximou-se um pouco da boca de cena, e mais tarde confirmou-nos que ainda antes de tudo ficar inexoravelmente perdido chegou a temer pela própria pele, e negou-O.
O resto já se sabe, Jesus foi sentenciado na cruz dos malfeitores depois duma tortura longa e
horrível. Nunca se ouvirá falar de igual!
José, senador respeitado, veio, discreto e
destemido, de Arimateia, e mostrou mais
coragem que todos nós juntos: pediu a Pilatos o corpo de Jesus, perfumou-o e deu-lhe sepultura digna num túmulo novo.
A morte de Jesus tirou-nos as forças e as
convicções. Estávamos derreados, frustrados, aturdidos, desolados. Era noite, como disse João. Tudo foi tão rápido, tão rápido que só evidenciou a nossa cobardia. Aonde poderia aquilo levar-nos ninguém sabia. Vivíamos no desamparo absoluto. Éramos livres, embora encurralados. Maria estava connosco, é certo, mas a sua serenidade confundia-nos e só agora a entendemos, porque olhando os nossos
temores só pensávamos que estivesse como nós!
Antes de tudo se precipitar Ele procurara
encorajar-nos, mas não percebemos nada. Prometeu ficar connosco até ao fim, mas não sabíamos o que isso queria dizer. Disse: «Tomai todos e comei; tomai e bebei». E nós?... Nós... A sombra da cruz caía já e impunha-nos respeito e silêncio. Quem haveria de suspeitar que Jesus nos dava ali a liberdade? Que aquele cálice só pode ser bebido como um projecto novo, do Reino já no horizonte, e sob o alento do Abbá?
Não percebemos nada! Fomos uns tontos! Só mais tarde é que se fez luz! O segundo dia foi um absurdo. No amanhecer do terceiro dia ouviram-se uns zun-zuns. As mulheres do grupo
sobressaltaram-nos com notícias que fizeram correr Pedro e João, mas a ausência do corpo só fez aumentar a dor. E o dia foi caindo duro como o chão. O cair do entardecer esmagava-nos como uma montanha. Quem ainda tinha
esperança? Ninguém, ou talvez só Maria...
Alguns fizeram-se à vida e foram saindo, como Cléofas e Josué, para Emaús. Podeis imaginar a cena quando nos apareceram loucos e esbaforidos: «Nós vimos o Senhor, nós vimos o Senhor!»? Não, não podeis. Mas quem poderia acreditar naquilo? Bem, a verdade é que a cena começava a repetir-se. Primeiro foi Madalena; depois Pedro e João; e nós, os Onze; e depois apareceu-nos na praia à volta dumas brasas...
E eu também O vi! Por fim todos afirmavam que estava vivo! Era desconcertante! Disse-nos: «Não tenhais medo! A paz esteja convosco! Alegrai-vos!». Era o que precisávamos de ouvir.
Os nossos encontros com o Ressuscitado foram reais, não um sonho. Não estávamos loucos! Cristo, minha esperança, ressuscitou! Não podíamos calar a alegria!
Só então comecei a compreender quem era Jesus: era o Salvador! Só podia... Foi a coisa
mais luminosa da minha vida! Todos os que caminhámos com Ele e O vimos morto na cruz
passámos por este banho regenerador: Deus é Deus e ressuscitou Jesus arrancando-o dos braços da morte e dos laços do abismo. Deus deu razão a Jesus, a sua mensagem é de vida e de libertação. O nosso coração é como um ninho donde brotam certezas: Jesus está vivo, a sua vida é total e definitiva! Aceite quem quiser; só recusa quem não viveu o assombro de acreditar!
Chama do carmo I NS64 I Abril 4, 2010

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